UMA JORNADA DE 70 ANOS

No dia 25 de junho de 1949, há exatos setenta anos, meu pai e minha mãe estavam se unindo pelos laços do matrimônio. Ele de sólida família católica. Ela de sólida família protestante, como eram apelidados os evangélicos naqueles distantes dias. O casamento em si já foi um milagre. Durar setenta anos... é mais do que um milagre. É quase sobrenatural.
A cerimônia do casamento foi familiar, na casa do meu avô, pai de meu pai. Já que a família dele era católica e a família dela era evangélica... não seria feito em Igreja Católica e nem em Igreja Protestante. O combinado foi seguido à risca. Foi uma cerimônia bem familiar. Só minha mãe que não conseguiu concordar com o trato. Não se imaginava casando sem a benção de Deus. Que fazer?
A Igreja Batista de Ibitinga era assistida por um missionário visitador chamado João Rodrigues y Rodrigues, de nacionalidade espanhola. Para se contrapor ao combinado entre as famílias, ela fez o combinado dela com o tal missionário. Ele daria a benção sem dizer que era benção. Ele abençoaria de uma forma que não ofendesse a religiosidade da família de meu pai. Mas ela sabia que iria receber a benção sacerdotal e isso a tranquilizou.
No dia aprazado, todos os convidados presentes, o Missionário espanhol, que quase ninguém sabia quem era, levantou-se no meio da festividade e afirmou que desejava dizer algumas palavras aos noivos. Todos pararam. E ele começou a dizer palavras de benção que saiam de seu coração e enchiam o coração de todos, principalmente dos noivos (eles sabiam quem era o orador). No final...em vez da tradicional frase: Em nome do Pai ou Em nome do Senhor Jesus... ele simplesmente lascou: “Tenho dito”. Como se fosse um orador profissional tão ao gosto da época.
Mas a benção teve aprovação divina. Já lá se foram setenta anos completados neste dia em que rabisco essas linhas. Embora já tivesse se decidido a seguir o chamado do Senhor Jesus... meu pai só aderiu à fé cristã reformada alguns meses depois de casado. Respeitou a família de seu pai até o fim. Isso aprendi com ele. A fé cristã não se casa com a desonra familiar. Ele honrou seus pais até nesse quesito tão difícil. Três anos depois de ser aceito na pequena comunidade de cristãos evangélicos que se conhecia como Igreja Batista de Ibitinga, ele sentiu despertar sua vocação sacerdotal. Dez anos depois era consagrado oficialmente como integrante do Magistério Batista Brasileiro (Pastor).
Meu pai e minha mãe viveram para servir ao povo que buscava a salvação gratuita dada pelo Senhor Jesus ao morrer na cruz. Viveram e pregaram essa mensagem. Pregaram e viveram. Milhares alcançaram o entendimento e se completaram como discípulos do Senhor Jesus. Sítios, fazendas, vilas, ruas... outras cidades... outros países. Seu trabalho para Deus não encontrava limites. Mas onde ia... lá estava minha mãe ao lado dele, com raríssimas exceções que ocorriam quando das viagens internacionais. Andando... na famosa lambreta, no fusca, nos demais carros que Deus foi concedendo... lá estavam os dois... lado a lado... caminhando juntos... sofrendo juntos e se alegrando juntos.
Lutas? Sofrimentos? Sim... tiveram muitas lutas e muitos sofrimentos... mas a Palavra de Deus nos manda lembrar as dádivas do Senhor e não as dificuldades. Assim fazemos neste dia. No dia 16 deste mês, em um culto memorável, a multidão de irmãos e amigos de nossa Igreja e de muitas outras Igrejas se uniram num culto onde celebramos os 90 anos de vida do Pastor Antenor, de sua esposa, Pastora Maria, e os setenta anos de casamento.

Eu, como primogênito dessa família, unido aos meus irmãos e irmãs, desejamos expressar nossa alegria pelos pais que Deus nos deu. Todos nós... filhos, filhas, genros, noras, netos, netas, bisnetos e bisnetas, unidos a milhares de pessoas de nossa fé evangélica e a centenas de outros amigos e companheiros das mais diversas religiões, temos visto em meu pai um exemplo de homem digno, honrado. O típico exemplo de alguém que viveu para a glória de Deus. Com sua saúde já um pouquinho debilitada (ele não aceita que digamos isso) ele, às vezes, começa a pensar nas pessoas que estão caminhando, como diria o poeta, "sem rumo e sem direção", enfim, sem Deus, e sua reação é chorar. Chorar pelas pessoas que estão caminhando para o abismo sem atentar para a mão estendida do Salvador com a tábua de segurança. Quer que todos sejam salvos pela graça do Senhor.
Assim sendo, de que outra maneira poderíamos encerrar essa crônica de gratidão a não ser com a citação do versículo que ele amou e recebeu há mais de setenta anos? Evangelho segundo S. João – capítulo 3, versículo 16 :
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu filho unigênito para que todo aquele que NELE crê, não pereça, mas tenha a vida eterna”. Tenho certeza de que ele me interromperia neste instante e exclamaria como epílogo final: “Não esqueça de dizer que só Jesus Cristo pode nos salvar”.
Amém, pai... nós sabemos disso agora. E mesmo quem não é evangélico também já aprendeu isso. Que para sempre seja louvado o nome de JESUS CRISTO, o nome que está acima de todos os nomes sobre a terra. Amém.

Por.
Pr. Marcos Lourenço